O Jornalismo em dia de Japão à rasca

Mais de 70 pessoas juntaram-se em frente à embaixada portuguesa em Londres pelo movimento "Geração à Rasca"

Se há dias em que sinto o jornalismo a fervilhar-me nas veias, hoje foi um deles. Começou ontem, de mansinho. Primeiro, revoltei-me por ver que dois eventos tão importantes e tão diferentes – Japão e Geração à Rasca – decidiram acontecer exactamente nas mesmas 24 horas. Depois percebi que, enquanto jornalista, podia muito bem vivê-los em conjunto.

Escrevo este blog há sete anos. Nos últimos quatro escrevi muito sobre a minha vida pessoal e profissional na Alemanha, na Bélgica e agora no Reino Unido. Muitas vezes escrevi sobre a Saudade que sinto de Portugal. Hoje foi um dia em que, de certa forma, essa saudade se revoltou.

Fui com a minha irmã para a Embaixada de Portugal em Londres e vi cerca de 70 pessoas que ali marcavam presença, pouco ruidosamente, em solidariedade para com os 280 mil que se manifestavam em terra.  Na Belgrave Square, a idade dos jovens rondava os 30 anos. “Sou engenheiro, estou cá há cinco anos,” disse um deles. O tom de voz não era o da euforia que jovens recém-engenheiros na Avenida da Liberdade teriam se pudessem dizer a mesma frase. Era tom de… conquista. Alívio. Fuga.

Protesto "Geração à Rasca" em Londres

Quem protestou hoje por várias cidades europeias não o fez por solidariedade, mas para lembrar todos aqueles que estão “em terra” que, para muita gente, a solução encontrada foi fugir. Uma rapariga no protesto explicava a uma inglesa: “I’m not a typical emigrant. I’m rather a migrant – I’ve lived in the Netherlands, Spain, Italy, now UK…” Pois eu também vivi na Alemanha, em Bruxelas e em Londres e não digo as coisas dessa maneira. Acho que são vozes arrogantes como essa que passam a mensagem para “a terra” de que quem está fora é menino rico e acha que Portugal é pequeno demais para quem tem grandes ambições. Uma pena.

Por mais satisfeitos que os jovens portugueses estejam no estrangeiro, a verdade é que a grande maioria não teria ido embora se tivesse visto boas perspectivas em Portugal. E aí começa um estilo de vida quase viciante: viver fora é de uma intensidade e aprendizagem tais que os laços com “a terra” mudam. Ficamos mais críticos. Queremos que os nossos amigos – aqueles que (ainda) não fugiram – nos oiçam sem nos julgar. Arrisco falar por muitos dos jovens portugueses que estudam ou trabalham noutros países: é triste que nos vejam como gente que teve a vida facilitada.

Foi isso que eu senti na cara de várias das pessoas que se juntaram na embaixada em Londres, quase em silêncio e ao frio. Pessoas que têm trabalho, são bem pagas e têm boas perspectivas de carreira – mas que se forçam a não esquecer que estão assim porque Portugal não lhes proporcionou o mesmo “em terra”. Desenrascaram-se.

A revolução dos media em dia #manif, a #12Mar

Não estava um único meio de comunicação social junto à embaixada de Portugal de uma das cidades com mais jovens portugueses. A TSF mostrou interesse em que eu falasse com eles durante o protesto, mas no fim foram eles quem não se manifestou. Talvez porque, como acontece tantas vezes na nossa comunicação social, é difícil atravessar fronteiras?

Optei então por fazer a cobertura via Twitter, descrevendo o ambiente e publicando fotografias e vídeos do protesto. Alguns jornalistas portugueses na rede social ajudaram a divulgar. Cumpri o meu dever. Se é dever de jornalista ou não, não sei; o meu cartão de imprensa alemão caducou em Dezembro e o que obtive no Reino Unido tem estatuto de estudante. Mas, em Portugal, “para ter a carteira, tem de trabalhar para um órgão de comunicação social português.”

No meu país, não tenho direito a carteira profissional de jornalista, apesar de ter trabalhado na Alemanha para o serviço português de uma rádio internacional, transmitido para todo o mundo. Tinha menos direito a ser reconhecida como jornalista do que um profissional do defunto Tal & Qual.

Hoje no Twitter lia-se “adesão inegavelmente surpreendente”, “Sócrates também deveria estar à rasca”, “há um mal-estar insuportável no país” e “demasiadas queixas, poucas soluções”.

Vários jornalistas elegeram a cobertura do protesto pela RTPN e pelo Jornal de Negócios como a melhor do país.

Os grandes nomes da imprensa subestimaram o protesto. Ou alguém os fez calar.

Mais uma vez estive longe num dia importante para o meu país. E mais uma vez percebi que, quanto mais tempo passo cá longe, mais vontade tenho de voltar – e de usar o que aprendi para realmente contribuir para a mudança de mentalidade de que Portugal precisa.

[E porque #prayforjapan infelizmente não acaba hoje, fica para depois a análise do que se passa do outro lado do mundo.]


4 Respostas

  1. Miúda,
    Digo-te assim: estou a chorar.
    Compreendo de tudo.
    O sair para vir fazer melhor aqui, principalmente.
    No fundo, queremos todos o regresso.
    Que possas regressar. Com mais força e com tudo aquilo que ganhaste. Para ajudares a mudar isto.
    Porque, pode ser que ainda não saibam, mas vão precisar de ti. Eu sei que hoje fizeste lá falta.
    Por tudo.
    Porque sabes o quanto tenho orgulho em ti.
    Gosto-te.

  2. Que papel está reservado aos portugueses-espanhóis-gregos-romenos-africanos-etc-etc de hoje?
    … rezar o terço e … esperar pelo milagre?

    Tem que se sonhar com alguma coisa. Nem que seja para criar a vontade do regresso…

  3. Por que não fazem uma matéria sobre modelos japoneses que saem em revista “MASCULINA” ?

  4. Tem muitos modelos japoneses que nós brasileiro (a)s precisamos conhecer. Obrigado por algum janalista que lê e puzerem para nós veê.

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